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HomeQUALQUER NOTA“A Cama na Rua” por Aldir Blanc

“A Cama na Rua” por Aldir Blanc

  • 3 de maio de 2020
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  • da Redação
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“A Cama na Rua” por Aldir Blanc

Aldir Blanc (1946-2020) foi um grande letrista, mas também um excelente escritor, com um humor meio rodrigueano, mas ainda mais safado e sem vergonha. Suas crônicas seguem na mesma tradição de Lima Barreto: são instantâneos da vida suburbana narrados por um cara que dominava a narrativa como um príncipe. O texto a seguir é do livro “Rua dos Artistas e Arredores”, da Mórula Editorial. 

Isolda morava quase em frente. Pequena, de cabelos até a cintura, vestia sempre saia justa preta, sapatos salto sete e meio e ria com facilidade. Verdadeira deusa dos padeiros, bombeiros e outros eiros.

Mães, avós, tias, eram unânimes:

— Mulher da vida!

Os homens aprovavam com a cabeça, meio distantes e – seria indignação moral? – fitavam Isolda fumando furiosamente.

A bem verdade que a fama de Isolda não se devia apenas aos seus, como diria vovó, modos.

Uma vez ou outra, aparecia na casa dela um tal de Rodolfo, terno branco de linho, cabelo “Príncipe Danilo” e, naturalmente, bigodes. Toda a rua sabia quando Rodolfo chegava porque, assim que Isolda abria a porta, ele, sem ao menos cumprimentar, tacava a mão na cara da coitadinha. Ciúmes? Teria Isolda prevaricado? Ou era Rodolfo violento por natureza?

Desses mistérios que nunca se desfazem.

Já dentro de casa, Rodolfo ligava o rádio bem alto e continuava o festival de porrada.

— Ai, destraçado! Você devia ter morrido no parto com a tua mãe!

CATAPIMBA!

Vinha todo mundo pras janelas e, enquanto Isolda gritava, comentava-se discretamente;

— Eita, botina!

— Dá-lhe, Rigoni!

–… tá com cara de que vai render…

— Hmmm! Essa foi na boca!

— … pancada de amor não dói, dona Otília. E a sua asma, como vai?

E assim, todos participavam da desventura de Isolda, talvez até – dadas as circunstâncias – com excessivo entusiasmo.

Porque, aos poucos, os gritos iam diminuindo, diminuindo, até que a residência de Isolda ficava em completo silêncio. A expectativa crescia em toda a rua. Conversava-se apenas para disfarçar:

— Toma um chazinho de erva-cidreira…

— Até aí morreu o Neves, hehe…

— Desta vez, vamos!

E a tensão aumentando.

De repente – por mais que esperássemos, era sempre de repente – o grito emudecia a rua inteirinha.

— Ai, Rodolfo! Eu vou morrer!

Estaria o pérfido cáften estripando Isolda com a arma branca dos de sua laia? Suportaria a infeliz nova e horripilante atrocidade?

Suportaria, meus chapinhas.

— Assim, Rodolfo! Me chama de manga-espada…

Manga-espada, Isolda? Eu só entenderia mais tarde, tirando fiapos dos dentes.

Rodolfo – provavelmente mineiro – trabalhava em silêncio. Todo mundo mantinha a naturalidade da hipocrisia:

— Não põe os pés nessa água, menino!

— Tão dizendo que o Castilho não joga…

E correndo por fora:

— Bota a cama na rua, Dolfo! Bota a cama na rua pra todo mundo ver como eu sou feliz! Ai, como eu sou feliz!

Era assim o amor de Isolda e Rodolfo. Mais violento que todos os amores da Rua dos Artistas. Mais verdadeiro também. Fazia parte das coisas da rua, como as crianças, como as árvores, como a passagem do garrafeeeiro…

Quando Isolda, findo o embate, ia comprar cerveja pro seu bem, era olhada com inveja pelas mulheres, com desejo pelos homens, e em um ou outro olhar havia mesmo simpatia – meio disfarçada, meio de encolha, mas tava lá.

Houve uma noite memorável!

Isolda, delirante e romântica, implorou a plenos pulmões:

— Diz, Dolfo! Diz que eu sou tua gazelazinha, diz!

E o garboso Dolfo, sincero, mas um pouco atabalhoado:

— Toma, sua vaca!

Todos ouvimos, emocionados, o terrível soluçar de Isolda. Minha avó não se conteve:

— Ah, monstro de crueldade!

Alguém bradou:

— Eu boto a tropa na rua!

E só não houve uma catástrofe de desconhecidas proporções porque o motivo de tão desconsolado pranto surgiu, segundo depois, na própria voz de Isolda:

— VOCÊ DIZ ISSO A TODAS!

 

 

 

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Alguém da equipe escreveu, mas ficou com vergonha de assinar.

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